quarta-feira, 25 de novembro de 2015

AMIGO DE LULA NA CADEIA


ESCÂNDALOS EM SÉRIE


POR CLEIDE CARVALHO E JAQUELINE FALCÃO

Lava-Jato. Acompanhado por agentes da Polícia Federal, Bumlai chega a Curitiba: pecuarista foi preso em Brasília, onde estava para prestar depoimento na CPI do BNDES





-SÃO PAULO E CURITIBA- O pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi preso ontem em Brasília pela Polícia Federal, na 21ª fase da Operação Lava-Jato, horas antes de ir ao Congresso prestar depoimento na CPI do BNDES. Bumlai é acusado de ter intermediado um contrato bilionário do Grupo Schahin com a Petrobras em troca da anistia de um empréstimo contraído por ele junto ao Banco Schahin para pagar dívidas da campanha presidencial do PT em 2002, quando Lula foi eleito.

A PF batizou a operação de ontem de Passe Livre, pela facilidade com que Bumlai transitava no Palácio do Planalto durante o governo Lula. Mas, embora muitos delatores tenham afirmado que o pecuarista usava o nome de Lula, a Operação Lava-Jato diz que não há provas contra o ex-presidente.

Segundo a denúncia, o esquema de Bumlai envolveu dois ex-tesoureiros do PT — Delúbio Soares e João Vaccari Neto —, que agiram em momentos diferentes da negociação com o grupo Schahin, e passou pelo Palácio do Planalto, mais precisamente por José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil, preso na Lava-Jato. Para o juiz Sérgio Moro, o pecuarista disponibilizou seu nome e o de suas empresas para “viabilizar de maneira fraudulenta recursos a partido político, com todos os danos decorrentes à democracia”.

O nome de Bumlai foi vinculado ao escândalo da Petrobras pelos delatores Fernando Baiano, Eduardo Musa (exgerente da Petrobras) e Salim Schahin — este último justamente dono do banco que fez o empréstimo para Bumlai e da empresa que fechou o contrato com a Petrobras. O Ministério Público Federal afirma que o pecuarista usou um esquema baseado em empréstimos bancários para desvio de dinheiro público. Para o procurador Diogo de Mattos, o mecanismo repetiu o mensalão.

— Um empréstimo que nunca é cobrado, especialmente por uma instituição financeira, que tem enormes prejuízos pela não cobrança, é indicativo claro de que era simulado — afirmou Mattos.

DÍVIDA DE CAMPANHA DO PT A Lava-Jato fez a vinculação entre um empréstimo de R$ 12,1 milhões concedido pelo Banco Schahin a Bumlai, em 2004, e um contrato de US$ 1,6 bilhão que o grupo Schahin fechou com a Petrobras, em 2009, para operar o naviosonda Vitória 10000 por 20 anos. Baiano e Musa delataram que Bumlai intermediou o negócio com o objetivo de saldar parte da dívida de R$ 60 milhões da campanha do PT de 2002.

O mais importante dos delatores é Salim Schahin, sócio do grupo que leva o sobrenome da família. Ele confirmou que o empréstimo dado a Bumlai foi negociado numa reunião na sede do banco com a presença de Delúbio Soares, então tesoureiro do PT. Para dar segurança aos banqueiros de que estavam fechando um negócio com o PT, Delúbio e Bumlai teriam dito que, “como evidência adicional”, a Casa Civil procuraria um dos acionistas do Schahin. Salim disse que, de fato, recebeu dias depois um telefonema do então ministro Dirceu. Contou que falaram apenas amenidades, mas, para o banqueiro, “a mensagem estava entendida”.

No mesmo ano em que recebeu o crédito do banco Schahin, Bumlai emprestou R$ 12,6 milhões à Fazenda Eldorado, de Natalino e Silmar Bertin, ambos levados a depor coercitivamente ontem. A dívida de Bumlai com o banco Schahin, porém, nunca foi paga — o acerto só veio após o grupo conseguir o contrato com a Petrobras, em 2009. O banco chegou a renovar o empréstimo três vezes, em 2005. Em seguida, fez três empréstimos à Agro Caieiras, outra empresa de Bumlai, para que fosse quitado o financiamento inicial.

Sem receber até 2006, Salim Schahin diz ter procurado o então tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, em busca de “auxílio político” para que o grupo obtivesse o contrato com a Petrobras. Segundo ele, ficou combinado que a contratação quitaria o empréstimo de Bumlai.

Em 2007, ainda durante as negociações, a dívida de Bumlai foi transferida à securitizadora do grupo Schahin, tirando o banco, que hoje pertence ao BMG, da mira do Banco Central. A esta altura, o valor da dívida alcançava R$ 21,2 milhões. Salim diz ter se encontrado várias vezes com Vaccari para discutir o assunto, e que o tesoureiro do PT teria lhe dito que Lula estava “a par do negócio”.

Fernando Baiano disse ter sido procurado por Bumlai em 2006 para intermediar negócios com a Schahin. O contrato para a Schahin operar o navio-sonda Vitória 10000 chegou a ser levado duas vezes à diretoria da Petrobras, sem sucesso. Baiano disse que, para resolver o problema, Bumlai acionou os contatos dele, em especial José Sérgio Gabrielli, então presidente da estatal, e Lula. Segundo Baiano, depois disso o negócio foi aprovado. Quem levou o contrato para a diretoria da estatal foi Eduardo Musa.

PROPINA NA SUÍÇA Quando o contrato com a Petrobras foi fechado, os Schahin consideraram quitada a dívida de Bumlai com o banco, e para isso simularam ter recebido o pagamento em embriões de gado. A Schahin passou a pagar propina para dirigentes da Petrobras. Musa, por exemplo, recebeu US$ 720 mil na Suíça. Já Baiano disse que Jorge Luz, operador do PMDB, que ficara fora das tratativas, também negociou com a Schahin propina entre US$ 3 milhões e US$ 4 milhões.

Na operação de ontem, dois filhos de Bumlai e uma nora foram levados coercitivamente para depor. O MPF havia pedido a prisão temporária dos três, mas Sérgio Moro negou.

Além das delações, a quebra de sigilo de Bumlai revelou “saques sucessivos e vultosos”, em espécie, feitos até 2014, nas contas bancárias dele e de suas empresas. Para Moro, saques em dinheiro não constituem crime, mas são expediente usado “para evitar rastreamento bancário”. Em 2011, ocorreram duas transferências, de R$ 1 milhão cada, da São Fernando Açúcar e Álcool, de Bumlai, para a empresa de fachada Legend, que lavou dinheiro de dirigentes da Petrobras.

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) identificou também quatorze saques em dinheiro, em quantias superiores a R$ 100 mil, das contas da usina, entre 2010 e 2013. Nas contas pessoais do pecuarista foram 21 saques em espécie, num total de R$ 3,3 milhões. Um dos saques foi feito pelo policial militar Marcos Ferreira, também levado a depor ontem na Polícia Federal.


Fonte: O GLOBO 

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