Por
Gregg Roman e Gary C. Gambill
Durante
meses, os políticos ocidentais estão agonizando sobre o que fazer com as massas
de imigrantes muçulmanos sunitas que estão inundando a Europa em barcos,
principalmente sírios. Em grande parte ausente dessa discussão está a pergunta
da razão por que esse dilúvio está acontecendo.
Para
começar, não tem muito a ver diretamente com a guerra civil na Síria ou o
surgimento do ISIS. A vasta maioria dos 886.662 imigrantes que entraram
ilegalmente na Europa neste ano embarcaram na Turquia, um pouco mais da metade
deles eram sírios que já eram refugiados na Turquia há quatro anos.
“Autoridades da UE [União Europeia] disseram… que o governo turco era muito
eficaz, nos anos anteriores, em impedir que os refugiados saíssem da Turquia,”
de acordo com o jornal Wall Street Journal.
O
que causou o aumento forte na imigração é que o governo turco parou de
contê-la. Nos anos recentes, o governo turco vem permitindo que traficantes
humanos expandam vastamente suas operações, abaixando dez vezes menos os preços
(de 10.000 a 12.000 dólares por pessoa no ano passado para cerca de 1.250
dólares hoje, de acordo com um relatório). Isso produziu o que o jornal New
York Times chama de uma “economia de mercado negro multimilionária” que lucra
do tráfico, desde os contrabandistas até os fabricantes de balsas infláveis
baratas, coletes salva-vidas e outros equipamentos.
No
início deste ano, havia ficado mais fácil e barato do que nunca antes entrar
ilegalmente na Europa por meio da Turquia, e mais pessoas estão tirando
vantagem da oportunidade que o governo turco criou.
Então,
por que o presidente turco Recep Tayyip Erdogan abriu a porteira? Em poucas
palavras, para extrair concessões financeiras, políticas e estratégicas dos
governos europeus em troca do fechamento da porteira.
O
governo turco não tem tido nenhuma vergonha de pedir dinheiro durante o curso
de suas negociações com autoridades da UE em semanas recentes. Em 29 de
novembro a UE concordou em dar para a Turquia uma “ajuda inicial” de 3,19
bilhões de dólares e acelerar o pedido turco de se unir a UE em troca de
promessas turcas de patrulhar melhor seus litorais.
Erdogan
também usou a crise para gerar apoio político externo antes das eleições
rápidas em 1 de novembro, essencialmente uma repetição das eleições de junho de
2015 que viu o partido AKP perder sua maioria parlamentar pela primeira vez.
Embora o protocolo diplomático ocidental desaprove visitas estatais durante a
época da eleição, a chanceler alemã Angela Merkel visitou Istambul para
reuniões de alto nível com Erdogan e o primeiro-ministro Ahmet Davutoglu apenas
duas semanas antes da votação. A Comissão Europeia adiou a divulgação de um
relatório que explica em detalhe a erosão do Estado Democrático de Direito, a
liberdade de expressão e a independência judicial na Turquia até depois da
eleição a fim de, de acordo com a Reuters, “evitar antagonizar” o presidente da
Turquia.
Talvez
o mais preocupante é o fato de que a Turquia está buscando compensações
financeiras por sua agressão imigratória à Europa. Numa carta enviada aos
líderes europeus na cúpula de imigração da UE em 23 de setembro, Davutoglu
propôs a criação de uma “zona segura” e uma zona de proibição de voos sob
controle dos EUA que se estendesse desde a fronteira turca até 80 km dentro do
norte da Síria, onde seu governo tem apoiado uma variedade de insurgentes
islâmicos sunitas contra o exército sírio e os curdos locais.
Embora
o começo da intervenção militar russa na Síria em 30 de setembro tivesse dado
um basta nessa fantasia por enquanto (o que talvez explique por que os turcos
foram tão rápidos para puxar o gatilho e abater um avião russo que violou de
leve seu espaço aéreo em 24 de novembro), pode apostar que Erdogan usará a
crise imigratória para pressionar o Ocidente a apoiar suas ambições na Síria.
Se
tudo isso parece familiar, é porque o falecido líder líbio Muammar Gaddafi
costumava fazer o mesmo jogo, abrindo e fechando a porteira da imigração ilegal
de africanos para a Europa como um meio de extrair concessões. A questão mais
problemática, então e agora, não é o que fazer com os imigrantes, mas o que
fazer com um governo que de forma tão cruel manipula as massas de seres humanos
oprimidos como tática de pressão diplomática.
Nisso
há espaço para debate. Mas o primeiro passo para se fazer algo sobre isso é
chamar Erdogan do que ele é — perigoso e manipulador. Ele não é amigo dos
líderes ocidentais. Contudo, depois da reunião com Erdogan em Paris na
terça-feira, o presidente Obama louvou a Turquia por ser “extraordinariamente
generosa no que se refere ao seu apoio aos refugiados.”
O
próximo passo, em vez de subornar a Turquia com pagamentos de resgates para
encerrar a imigração de refugiados da Síria e Oriente Médio para o Ocidente, o
Ocidente deveria fazer o feitiço virar contra o feiticeiro — o governo turco. A
perda potencial de apoio ocidental à Turquia enquanto lida com a Rússia e o
ISIS deveria ser o alerta de desastre iminente, convencendo Erdogan a conter a
crise de refugiados.
O
apoio material ocidental à Turquia deveria ser cortado totalmente a menos que o
governo turco acabe com a crise de refugiados que o próprio governo turco está
fabricando e comece a trazer estabilidade para a região. É oportuno que uma
antiga tragédia grega perturbe a atual realidade calamitosa criada pelos
turcos.
Fonte: www.juliosevero.com
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