segunda-feira, 30 de novembro de 2015

CHEGA DE CINISMO

Por Geovani F. dos Santos


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Já é tempo dos brasileiros despertarem de sua dormência e exigirem instituições que sejam coerentes com o ideário democrático e com a moralidade. Estamos fartos de assistir a vigarice ser perpetuada como se fosse virtude. As nulidades que nos acompanham por décadas precisam ser expurgadas para dar lugar a indivíduos que sejam comprometidos com a transparência e a honradez. Os larápios precisam ser expulsos para o bem da nação, caso contrário o barco vai a pique mesmo.

Não podemos ficar passivos como “vacas de presépio" diante do vultoso aumento dos escândalos em solo tupiniquim. Só o fato de  existirem deveria causar-nos constrangimentos nas entranhas. Precisa-se reagir ao cinismo dos que nos tiram como otários e sugam para si, para a locupletação tudo o que nos é caro, ou seja, a nossa dignidade e o nosso senso de caráter justo.

Os que praticam ilícitos consideram estes valores obsoletos, pois, do contrário teriam abandonado essa vereda sinuosa de malfeitos. Mas como não se veem apanhados em maus-lençóis ou achar que sempre serão inimputáveis, continuam o seu caminho transgressor contumazmente. Um exemplo é perceptível na conduta do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, que nega peremptoriamente que possua contas na Suíça.

O referido Deputado não têm mais a seu favor, sequer o benefício da dúvida, dado os flagrantes indícios de movimentações financeiras monstruosas que tem sido reveladas pela Operação Lava-Jato. Querendo ou não este senhor terá que prestar contas à justiça, que há tanto tempo por ele tem sido desdenhada.


Como o crime não compensa, a qualquer momento veremos os resultados de tais más- ações virem à tona e o dito senhor poder ver o sol nascer quadrado em uma cela da prisão.      


LARGADA SOB PRESSÃO



Antes mesmo do início da conferência em Paris, ONU afirma que metas devem ser revistas


POR VIVIAN OSWALD




A chamada foto de família que será feita hoje na capital francesa pouco antes da abertura oficial da COP-21 dá a dimensão do que está em jogo nas próximas duas semanas. Os 150 chefes de Estado e de governo presentes ali fazem desta a maior Conferência do Clima de todos os tempos. Deles dependerá o que pode ser um acordo global histórico ou um imenso fracasso. Sobre a mesa, os 195 países representados na cúpula terão o desafio de ir além das propostas voluntárias que já apresentaram para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Pouco depois da abertura simbólica dos trabalhos das delegações ontem, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, afirmou que, juntas, elas não são suficientes para evitar o aquecimento global em até 2 graus Celsius em relação à era pré-industrial. E já propôs uma revisão dos números antes de 2020:

— Não é suficiente. Temos de fazer mais e depressa para conseguirmos conter o aquecimento global abaixo de 2° C.

Pela primeira vez, as autoridades máximas das nações se reúnem no início da conferência, ideia da França, que preside o encontro, com o objetivo de azeitar o diálogo. Resta saber em que medida isso aumentará o poder dos negociadores para obter um acordo mais audacioso, como quer Ban Ki-moon.

BRASIL DEFENDERÁ MAIS RECURSOS

Conhecida como a “ministra do Futuro” da Suécia, a chefe da pasta de Desenvolvimento Estratégico daquele país, Cristina Persson, reforça a cobrança do secretário-geral da ONU. Em entrevista ao GLOBO, Cristina ressalta que, mesmo que as nações cumpram as promessas anunciadas em seus planos de ação, não será suficiente para restringir o aumento da temperatura a 2 graus Celsius. Como representantes de outros países europeus, ela defende compromissos obrigatórios e mecanismos que promovam a transparência e permitam monitorar a evolução do cumprimento das metas, de preferência a cada cinco anos.

— Existe um grande “se” aí. Se eles cumprirem, ainda assim não vai ser suficiente. Somados, os planos de ação ainda gerariam um aquecimento de 2,7 graus Celsius — afirmou.

Ao pedir audácia, a ministra mostrará aos presentes que a Suécia deve ser um dos primeiros países do mundo cujo sistema de transportes estará livre de combustíveis fósseis até 2030. O país estuda reduzir tributos para os automóveis elétricos e híbridos e cobrar impostos mais altos daqueles que insistirem nos combustíveis fósseis. Durante o encontro, vários países devem tentar martelar a ideia de que cortar as emissões é um bom negócio.

Durante os próximos dias, os países também vão buscar fontes de financiamento para os novos projetos e compromissos legais, visando evitar o que aconteceu após o Protocolo de Kioto.

O Brasil defenderá mais recursos do que os US$ 100 bilhões já prometidos e a obrigatoriedade das metas. A aposta do país é que as consultas informais, que já começaram, acelerem as negociações. Para a vice-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), a pesquisadora brasileira Thelma Krug, a entrega dos planos de ação antes da cúpula pode ser um prenúncio de um acordo:

— Existe um engajamento agora que não havia na Conferência de Copenhague e uma percepção da urgência. É isso que me deixa otimista.

A preocupação dos líderes é mostrar unidade entre as nações, solidariedade e destemor, logo depois dos atentados terroristas que três semanas atrás mataram 139 pessoas em Paris e chocaram o mundo. No entanto, por maiores que sejam os esforços da organização francesa e dos 40 mil participantes da COP-21, não há como negar que o assunto terrorismo já mudou, ainda que parcialmente, a cara e a agenda do encontro. Ontem, a sessão simbólica começou com um minuto de silêncio em homenagem às vítimas dos ataques do último dia 13.

Ontem, dezenas de viaturas policiais e milhares de soldados fortemente armados estavam plantados em esquinas estratégicas ou em cartões-postais da capital francesa. Quarteirões inteiros foram fechados, assim como as principais vias de acesso à cidade. À tarde, cerca de duas centenas de manifestantes lutaram com a polícia em uma das ruas que levam à Praça da República, onde, a despeito das proibições de protestos e aglomerações, milhares se reuniram para formar uma corrente humana em uma avenida próxima. Os manifestantes carregavam cartazes pedindo a defesa do clima e da democracia. No lugar das pessoas, proibidas de se aglomerar, eles deixaram pares de sapatos em uma instalação que ocupou quase toda a praça. Depois dos confrontos, cerca de cem manifestantes contrários à COP-21 foram presos. Ao todo, 200 foram detidos no país.

Na Rue du Faubourg Saint-Honoré, onde estão hospedados a presidente Dilma Rousseff e outros chefes de Estado, há mais de 50 policiais fazendo a segurança do entorno. Dilma almoçou e jantou no hotel, onde se reuniu com a primeira ministra da Noruega, Erna Solberg, e o presidente da Bolívia, Evo Morales.


Fonte: O Globo

A POLÍTICA PRAGMÁTICA DE MERKEL






A Europa precisa urgentemente da Turquia, e sem ela não poderá reduzir a pressão sobre as suas fronteiras

POR ALISON SMALE
 

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Com até um milhão de refugiados chegando este ano à Alemanha, a chanceler federal Angela Merkel encontra-se cada vez mais isolada na Europa, além de significativamente menos popular internamente do que durante a crise no euro, meses atrás.

Até agora, Merkel rejeitou todos os pedidos — o mais forte deles vindo de seu próprio bloco conservador — para limitar o fluxo de recém-chegados. Mesmo que a Alemanha não seja capaz de oferecer abrigo, ela argumenta que é muito pouco caridoso e fisicamente impraticável deter o fluxo humano num país com milhares de quilômetros de fronteiras terrestres — além de ser uma obrigação por seu passado nazista.

No entanto, o que ela e outros líderes europeus fizeram silenciosamente nas últimas semanas foi dificultar a política de asilo, restringir reuniões de família a refugiados e montar campanhas para impedir que pessoas saiam de seus países para a Europa. Nações dos Bálcãs, no meio da trilha migratória da Turquia e da Grécia para Alemanha e Suécia, têm sido incentivadas a barrar todos os imigrantes que não sejam sírios, iraquianos e afegãos.

Merkel costumava se opor à adesão turca à União Europeia, e a própria Europa duvida do respeito do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, aos direitos humanos. Mas o acordo com a Turquia é uma medida para atingir objetivos pragmáticos, não importa o quão contraditória pareça.

— A Europa precisa urgentemente da Turquia, e sem ela não poderá reduzir a pressão sobre as suas fronteiras — diz Jan Techau, diretor do Carnegie Europe, centro de estudos de Bruxelas. — A Alemanha e a UE estão fazendo um jogo de simpatia com Erdogan, quando praticamente todos desdenham dele. É um enorme compromisso político. Não é uma coisa particularmente bonita. Mas, no final, não há realmente mais o que fazer. Merkel também mudou na questão dos refugiados, diz Daniela Schwarzer, diretora de Europa do German Marshall Fund, centro de estudos dos EUA.

— Definitivamente, ela está mudando sua postura progressista e firme adotada no auge da crise, quando disse que precisava acolher os sírios. A retórica mudou.

Merkel está consciente não só da queda em sua aprovação — de 75% há seis meses para 50% agora — mas da ascensão do Alternativa para a Alemanha, partido que vem superando nas pesquisas o obstáculo de 5% de votos necessários para chegar a Parlamentos estaduais ou ao federal. No Leste, o movimento anti-Islã Pegida atrai milhares de pessoas a marchas semanais em Dresden.

A postura de Merkel sobre os refugiados tem mexido na política alemã. Nomes da esquerda que a criticavam elogiam sua firmeza em abrigar os necessitados. Os conservadores pedem cada vez mais um limite, e — menos publicamente — murmuram a possibilidade da substituição da chanceler, há uma década no poder.

No entanto, há poucas ou nenhuma alternativa, e tampouco há sinal de que Merkel enfrentará hostilidade aberta no congresso de dezembro do seu partido, a União Democrata-Cristã. Mesmo após os ataques de Paris, os alemães mais velhos, em particular, temem a guinada à direita mais ainda do que o terrorismo islâmico.


Fonte: O Globo

O IMBRÓGLIO FRANCÊS

Por Geovani F.dos Santos


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Em entrevista ao Globo, o ex-ministro da cultura da França e diretor do Instituto Mundo Árabe, Jack Lang, falou sobre os ataques terroristas e a onda de radicalismo que assola o mundo. Perguntado de quem era a culpa por tudo isso, Lang foi incisivo, apontando o ex-presidente George W. Bush e a sua política desastrada no Iraque como responsável pela emergência do Estado Islâmico. Segundo Lang, o processo político que se realizou após a queda do ditador iraquiano Sadam Hussein, foi marcado pela influência da religião e do sectarismo faccioso, que excluiu do processo eleitoral os sunitas, dando margem a uma cisão perigosa que culminou na ascensão do radicalismo islâmico e no atual quadro de beligerância no Oriente Médio. A desestabilização do Iraque foi o trampolim para que a situação política saísse do controle e grupos marginais entrassem no cenário conturbado do pais para espalhar o caos e o terror, que, depois estendeu os seus tentáculos sobre o Continente Europeu.


Em seu discurso esquerdista de oposição, Jack Lang se opõe à política de Hollande e é avesso a ideia de se enviar tropas terrestres para combater o EI. De acordo com ele, o correto seria continuar dando apoio logístico e financeiro aos insurgentes, para que estes continuem a luta contra os terroristas em solo Sírio. No entanto, reconhece que esta ajuda tem sido tardia, o que de certo modo permitiu que os criminosos radicais do EI se fortalecessem e tomassem o controle de grandes extensões dentro do território sírio e no Iraque.  

A POLÍTICA CRIMINOSA





*Por Denis Lerrer Rosenfield 




A prisão do senador Delcídio Amaral, ordenada pelo Supremo Tribunal Federal, e, depois, confirmada pelo Senado suscita uma série de questões que dizem respeito ao desenlace da atual crise. Agora, um fato novo vem à tona. Ele recoloca com força o problema de um governo que já acabou, embora a presidente relute em reconhecer esse fato que se impõe a todos os que pretendem ver a realidade. Parece que o país petista conseguiu ir além de qualquer limite, como se a impunidade e a corrupção fossem simples “regras” que deveriam ser seguidas.

O que imediatamente salta aos olhos é uma imensa crise de valores do mundo político e de setores do empresariado, em franca dissonância com os anseios da sociedade brasileira. O lulopetismo estabeleceu a corrupção como modo mesmo de governar, fazendo da impunidade um tipo de conduta que deveria ser seguido por todos. Os valores estão se esfacelando, como se não fossem mais fatores essenciais de coesão social.

Não seria, pois, de espantar o descrédito de que hoje goza a classe política, descrédito esse amplificado pelo fato de o PT, antanho “partido da ética”, simplesmente afirmar que essas coisas são “naturais”. Imaginem as pessoas que vivem com poucos salários-mínimos ou estão desempregadas vendo-se diante de um quadro de corrupção que consome milhões e, mesmo, bilhões de reais. A indignação e a desconfiança são, então, meras consequências.

A política petista pertence, hoje, à crônica policial. Uma política desprovida de qualquer pudor e sem nenhum valor moral tomou conta da cena pública, como se tudo fosse simplesmente válido para a conservação do poder. Limites éticos foram simplesmente desconsiderados. Ser “progressista” significaria, nada mais, do que ser conivente com o crime, incentivador deste, em nome dos “valores” superiores da esquerda e do socialismo.

Ora, o resultado de tal política carente de moralidade é o crime como modo mesmo de governar. A política tornou-se criminosa por sua completa ausência de ética, uma política sem freios de qualquer espécie. Note-se que os escândalos da época petista simplesmente se repetem e ganham novas dimensões. O senador Delcídio Amaral somente escancarou o caráter propriamente mafioso desta política, com a franqueza de uma conversa voltada para a obstrução da Justiça, que possibilitaria a fuga de um profundo conhecedor da política criminosa. Ele não seria o único beneficiário.

O senador procurou salvar-se, procurou salvar o seu banqueiro financiador. A presidente foi também citada por estar supostamente envolvida no escândalo de Pasadena. Pensou, sobretudo, nele, porém sem esquecer os desdobramentos políticos dos casos em que esteve envolvido. A política criminosa está se aproximando da própria presidente, além de já ter atingido o ex-presidente Lula, por intermédio de pessoas próximas como o empresário/amigo José Carlos Bumlai. Em um país que primasse pela moralidade pública e pela acepção mais elevada da política, a presidente já teria renunciado e seu criador, desde já, estaria prestando contas à Justiça.

Neste contexto de política criminosa, não deixa de surpreender a votação do Senado, de 59 votos contra 13 e 1 abstenção, pela manutenção da prisão do senador Delcídio Amaral. Isso porque vários destes senadores possuem investigações em curso no próprio STF, investigações essas que podem vir a comprometer os seus respectivos mandatos.

Ocorreu um fenômeno semelhante quando do impeachment do ex-presidente Collor, em que parlamentares com problemas com a Justiça terminaram por votar favoravelmente à sua saída. Não o fizeram por virtude ou por moralidade, mas premidos pelas circunstâncias, ciosos de conservar a sua própria imagem, por mais desfigurada que estivesse. Há, aqui, uma espécie de contribuição que o vício paga à virtude.

Isto, contudo, só foi possível graças à ampla repercussão obtida pelo áudio da gravação nos diferentes meios de comunicação. Criou-se um ambiente público de maior intolerância com a corrupção e com os políticos, fazendo com que os senadores pensassem duas vezes antes de tentarem empreender uma qualquer absolvição do senador Delcídio Amaral.

Senadores comprometidos com a moralidade, seja em foro íntimo, seja por imposição das circunstâncias públicas, terminaram se decidindo pelo voto aberto neste julgamento. Trata-se, aqui, de uma condição da maior relevância, na medida em que obriga os senadores a uma prestação de contas pública de seus mandatos, devendo se justificar perante os seus eleitores. Neste sentido, a votação preliminar pelo voto aberto foi da maior importância, oferecendo aos cidadãos brasileiros uma transparência política que contrasta tão flagrantemente com o caráter “oculto” da política criminosa.

Um dado particularmente surpreendente de todo esse episódio foi a nota da presidência do PT, na pessoa de Ruy Falcão, dessolidarizandose com o senador Delcídio Amaral. Vaccari, Delúbio, Zé Dirceu e João Paulo Cunha, entre outros, são considerados até hoje “guerreiros do povo brasileiro” por terem cometido atos criminosos em nome do partido. Reconheceram a política criminosa por eles mesmos inventada. Ora, o senador nada mais fez do que os outros fizeram, repetindo um comportamento padrão, em que os interesses partidários e pessoais se misturam tão intimamente. Resta saber se permanecerá calado, sofrendo em sua solidão. Se falar, concluirá o trabalho de desmoronamento da República petista.

O ex-presidente Lula não ficou atrás. Ao tomar conhecimento da gravação do Senador Delcídio Amaral, declarou que este seria “imbecil”, teria feito uma “burrada”. Não fez qualquer juízo moral, porém se contentou em dizer que não seguiu a habilidade própria da política criminosa, baseada no acobertamento. Considerou-o como não inteligente e não como imoral, injusto ou criminoso. Eis o seu padrão da “política”. O Brasil é o que menos importa para ele e para os seus companheiros.


Denis Lerrer Rosenfield é professor de Filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul


Fonte: O GLOBO


domingo, 29 de novembro de 2015

A CHERNOBYL BRASILEIRA



POR ANA LÚCIA AZEVEDO

Distrito fantasma. Ruínas da Escola Municipal Bento Rodrigues, no distrito rural destruído pelo rompimento da barragem de Fundão, da empresa Samarco, em Mariana: da unidade escolar sobraram paredes das salas de aula com quadros.


 

Toda noite, Antônio Alves senta-se sob um manacá no mesmo banco da Praça Gomes Freire, em Mariana. Para sentir “o cheiro do pertencimento, buscar a vida que tinha”. O perfume das flores lembra a seu Antônio, de 69 anos, sua terra, varrida deste mundo. Ele era de Bento Rodrigues, o distrito rural de Mariana tragado pela tsunami de lama e rejeitos de minério de ferro, no último dia 5, no maior desastre ambiental da História do Brasil.

Os manacás e tudo mais no povoado do século XVIII se perderam sob o mar de lama. Bento, como chamavam os moradores, se tornou uma Chernobyl brasileira. Não há contaminação radioativa, como na cidade ucraniana. Não há mais nada. Só a onipresente lama, que condenou Bento Rodrigues à desolação.

As vozes por lá agora são as muitas vozes do vento. Ele assobia pelos destroços, faz um telhado quebrado chacoalhar estridente. Sacode uma copa de árvore pesada de lama num chiado seco. Bate portas. Rola pequenos objeto a esmo. Joga no chão fotos de família.

Nas poucas ruas reabertas pelas equipes de resgate perambulam alguns animais, deixados para trás pelos donos em fuga. Vez por outra, uma galinha solitária cisca nos destroços. Numa casa com lama até as janelas, três cachorros magros, um deles com os ossos a espetar a pele, rosnam e ainda montam guarda. Esperam por donos que não vão voltar. Se tiverem sorte, serão resgatados por voluntários. Duas marianinhas (pequenos papagaios) encontraram refúgio num telhado quebrado.

A vida tenta surgir em forma de brotinhos de capim. Mas basta uma chuva que a lama escorre e os leva embora. Não uma lama de barro comum, mas densa e viscosa. Passado quase um mês, ela ainda estala, incha e cheira forte à carniça e substâncias insondáveis. Engole animais. Ameaça equipes de resgate em piscinas de areia movediça.

As poucas casas ainda de pé, em ruínas e destelhadas, têm as janelas escancaradas para o vazio. No horizonte, no chão, nas paredes, na copa das árvores e nas encostas, tudo o que há é lama. Cinza e marrom, em muitos tons. O cinza vem dos restos do itabirito, a rocha que contém hematita, de onde se extrai o ferro. O marrom é da quantidade colossal de rocha estilhaçada em pedaços grandes como ônibus e pequenos como grão de areia.

Em Mariana, a 35 quilômetros do epicentro da tragédia, os sobreviventes de Bento não veem consolo. Seu Antônio teme pensar no futuro. Queria fugir do presente:

— Me sinto órfão da terra que não tenho mais. Na casa onde nasci e vivia com a minha família até a lama da Samarco destruir tudo, meu avô plantou os manacás que tento lembrar neste banquinho de praça. Não conheci meu avô, os manacás eram a única lembrança que ele me deixou. A Samarco e sua lama me tiraram tudo, até as lembranças.

Ele, a mulher, as duas filhas e o neto moram hoje num hotel no Centro de Mariana, onde o banheiro é coletivo e a cozinha, comunitária. Foi lá que a Samarco os alojou com outros desabrigados pela tsunami de rejeito de minério. Os quatro cachorros da família foram resgatados por voluntários e estão num abrigo. Um teve parte de uma pata amputada. A família Alves espera voltar a ter um lar. E teme que esse lar sejam as casas que seriam construídas para abrigá-los perto de um aterro sanitário.

— Tínhamos um quintal com pimenteiras, couve, alface. Cultivávamos um tomate-cereja lindo, que comíamos todos os dias. E querem colocar a gente para viver ao lado do lixo? Numa terra contaminada? Tiraram nosso vale lindo e nos jogarão num aterro sanitário? Não é justo — diz Paula Alves, de 36 anos, filha de Seu Antônio.

Paula ficou famosa por salvar heroicamente mais de 400 moradores do distrito, ao sair com sua moto, uma cinquentinha, desesperada, para avisar a todos que a onda vinha para os engolir. “A barragem rompeu, a barragem rompeu”, gritou pelas ruas. Ela própria perdeu tudo. Até o celular novo, comprado em cinco prestações, a primeira ainda por vencer.

— Tinha esperado uma promoção para comprar. Era um celular chique, desses que fazem selfie. Mas não tive tempo de pegar. Perdemos a geladeira nova também, só não perdemos as prestações — lamenta ela, que teme ficar sem emprego, pois a empresa que trabalha é uma terceirizada para reflorestamento da Samarco e corre o risco de não ter o contrato renovado.

Ela queria voltar a Bento. Mas ainda não conseguiu ter acesso ao local onde morava.

— Poucas famílias conseguiram pegar o que restou. Alegam que não há segurança. Mas temos esse direito. Deveriam nos oferecer segurança para isso. Éramos uma comunidade muito unida, feliz. Todo mundo se conhecia desde a infância. A gente dormia sem trancas — diz ela.

Paula e o pai se emocionam ao olhar fotos das ruas destruídas e desertas de Bento Rodrigues.

— Olha a casa da Elizângela, o telhado foi parar em outra rua — aponta ela para um amontoado de escombros. — Essa aqui era do seu Filomeno, mas ele morreu logo depois da tragédia, de ataque do coração. Morreu de tristeza.

IGREJA DO PADROEIRO FOI DESTRUÍDA

Pelas ruas desertas de Bento parecem vagar fantasmas. Não os dos mortos do antigo cemitério da Igreja de São Bento, arrastada pela tsunami, e que agora jazem num túmulo sob toneladas de rejeitos de minério. São as lembranças dos vivos, assombrados pelas perdas de parentes, amigos e da própria terra. A igreja do padroeiro, São Bento, se foi com a lama e seu sino badalou por centenas de metros até ser engolido.

O sino soa na memória de Cristiano Sales, de 33 anos. Vizinho dos Alves, se orgulhava de morar em Bento. No dia 5 se atrasou na volta do trabalho e chegou mais tarde em casa. Descia a encosta quando viu a tsunami destroçar o vilarejo.

— Não consigo esquecer. Achei que meus pais tinham morrido, mas por milagre escaparam com a roupa do corpo. Veio a onda escura e imensa e arrastou a igreja. E ela se foi sem que o sino parasse de badalar. Tocava, tocava à medida que a lama levava tudo. Até que a torre afundou e levou junto o sino. Mas não houve silêncio. Era um inferno. O rugido horroroso da onda, estalos violentos das árvores quebradas. E os gritos de desespero. Por toda a noite foi assim. Desespero — desabafa Cristiano.

Todas as noites ele se lembra daquela noite. Menos numa em que sonhou que a onda era só um pesadelo.

— Eu estava com amigos no Bar da Sandra, era muito popular. Estava todo mundo de Bento lá, como sempre. Eu perguntava sobre a onda e a Sandra dizia que não tinha onda nenhuma. Mas aí eu acordo.

No lugar que era dele e dos cerca de 600 moradores de Bento há um caos de destroços. Um pé de bota é a única coisa no meio da rua principal. Na escola, se foram as portas e as janelas. Mas os quadros continuam nas paredes. Da Igreja de São Bento ficaram as ruínas do portal, dois degraus e um pedaço da base do batistério.

Um dos oficiais bombeiros que trabalham em Bento Rodrigues embarga a voz ao olhar para caos de restos de roupas, documentos, fotos.

— Estou acostumado com resgates, em ver gente em sofrimento. Mas nunca imaginei nada dessa dimensão. É uma desolação tão grande que faz pensar no que importa mesmo na vida. Nas pessoas que amamos — afirma ele.

Ao lado, um motorista de uma empreiteira diz que evita ver fotos do distrito antes da tragédia.


— Isso aqui já é uma coisa pavorosa. Descobrir como era a vida aqui só vai me deixar mais triste. Fotos são exatamente o que Paula quer ver: — Queria dar uma última olhada onde ficava minha casa. Poder me despedir da minha terra. Cristiano teme que a tragédia seja esquecida. — Ainda há desaparecidos. Ninguém nos informa nada direito. Busco olhar para o futuro. Mas vejo apenas ela, a tragédia, a lama.



Fonte: O Globo

Planalto enquadra petistas

Por Fernanda Krakovics, Júnia Gama Maria Lima






-RIO E BRASÍLIA -Depois do desembarque da oposição, da perda de apoio entre aliados e do desconforto no PMDB, cresce a insatisfação na bancada do PT com a política de boa vizinhança mantida pelo Palácio do Planalto e pela direção petista com o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O ministro Jaques Wagner (Casa Civil) convocou uma reunião com deputados do PT descontentes para a noite de hoje. Já o peemedebista, fiel ao seu estilo de se defender atacando, afirmou ontem que é “furado” acharem que ele vai cair antes de decidir sobre o pedido de abertura de processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff, o que promete fazer antes do recesso parlamentar, que começa em 22 de dezembro. Cunha disse ainda que “não existe qualquer hipótese” de se afastar do cargo.

— Furado é achar que vou cair. Mais furado ainda é achar que não vou decidir (sobre o impeachment) — afirmou Eduardo Cunha ao GLOBO, por meio de mensagem de texto.

Ele disse que na semana passada arquivou sete outros pedidos e que faltam outros sete para avaliar, o que pode fazer a qualquer momento:

— Não sei (se será na próxima semana). Vai ser na medida do meu convencimento.

O peemedebista ironizou as avaliações segundo as quais ele, isolado, pode cair antes e dar um refresco para a presidente Dilma.

— Todos os dias, faz quatro meses, esses mesmos articulistas falam que vou cair e estou aqui — respondeu.

A avaliação de governistas é que o clima para o impeachment esfriou e que a presidente ganha fôlego com o recesso parlamentar. A aposta é que, até fevereiro, quando o Congresso voltar a funcionar, Cunha já terá sido afastado do comando da Câmara e substituído por um aliado que enterre de vez a possibilidade de impeachment. Mas Cunha disse ontem que vai se decidir sobre os sete pedidos de impeachment ainda pendentes, inclusive o dos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal, antes do início do recesso.

Divergindo da orientação do Planalto e da direção partidária, mais da metade da bancada do PT quer partir para o enfrentamento com o presidente da Câmara. Dos 60 deputados petistas, 34 assinaram a representação contra Cunha protocolada pelo PSOL e pela Rede no Conselho de Ética da Casa.

— Quero que alguém me explique qual é o ganho de manter essa situação — disse um dos convidados para a conversa com Wagner.

O Planalto e a direção do PT continuam tentando ganhar tempo, temendo que um confronto com Cunha prejudique o governo. A preocupação é que o presidente da Câmara revide com a abertura de um processo de impeachment e que a crise política prejudique a votação de medidas do ajuste fiscal.

Ao discursar na abertura da reunião do Diretório Nacional do PT, no último dia 29, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que é mais importante aprovar as matérias de interesse do governo do que “derrubar” o presidente da Câmara.

— O Eduardo Cunha de fato não deve ser nossa prioridade, assim como também não é da oposição. A prioridade da oposição é o impeachment. O problema é que a situação evoluiu para uma conduta tão intolerável que teve até levante no plenário — disse um deputado do PT, referindo-se à reação, na última quinta-feira, à manobra de Cunha para obstruir os trabalhos do Conselho de Ética.

Deputados do PT reclamam por não terem sido consultados sobre a decisão de ajudar a não dar quórum para a sessão do Conselho de Ética, na última quinta-feira, embora sofram o desgaste gerado por essa medida. Segundo petistas, a articulação ficou restrita à direção do partido; ao líder da bancada, deputado Sibá Machado (PT); e aos integrantes do colegiado.

Em diversos setores do PT, há insatisfeitos com a exposição negativa, como o senador Jorge Viana (PT-AC). E ao menos um dos três deputados petistas no Conselho de Ética, Léo de Brito (PTAC), não pretende mais faltar às sessões e garante que votará com “ética” no caso. Ele disse ao GLOBO que ainda não decidiu como votará no processo, negou ter havido pedido por parte do governo para que o PT ajude Cunha e afirmou acreditar que o presidente da Câmara não fará “retaliação política” com o impeachment, se não for salvo pelo PT no Conselho de Ética.

— Minha posição é pelo pleno funcionamento da Comissão de Ética — disse outro petista, o deputado Paulo Teixeira, de São Paulo.

A situação do peemedebista se agravou consideravelmente na última quinta-feira, quando manobrou durante horas para impedir que a sessão do Conselho de Ética analisasse a admissibilidade do processo por quebra de decoro do qual é alvo.


A reação da oposição foi imediata, com duros discursos e o esvaziamento do plenário, e será intensificada esta semana, quando partidos oposicionistas ingressarão no Supremo Tribunal Federal e na Procuradoria-Geral da República pedindo o afastamento de Cunha da presidência da Casa. Está prevista ainda a obstrução das votações na Câmara enquanto Cunha continuar na presidência.

Fonte: O Globo

A CAMINHO DO XILINDRÓ



"O cerco está se fechando contra o petismo e a corrupção no Brasil. Com a prisão de Delcídio Amaral, parece que a justiça está mais perto de deslindar este liame. Se Cerveró abrir a boca e Delcídio, sentindo-se traído e abandonado pelo PT, decidir-se pela delação, a panela vai explodir. Esses dois sabem muita coisa, se não capitularem com o erro e a mentira nós teremos uma grande reviravolta neste país."

Crise entre Moscou e Ancara exige negociação

A derruba da de um caça russo SU-24 pela Força Aérea da Turquia, no início da semana, foi mais que um incidente diplomático a realçar a complexa realidade geopolítica do Oriente Médio. A ação mostra que a região é hoje a maior ameaça à paz mundial, devido a conflitos de interesses em escalas local, regional e global. Segundo a Turquia, o jato russo invadiu o espaço aéreo turco na fronteira com a Síria e foi alertado dez vezes antes de ser abatido. Moscou contesta a versão, afirmando que seus pilotos voavam em território sírio.


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Seja como for, Moscou não pode alegar que foi pego de surpresa. Desde que a Rússia iniciou os bombardeios na Síria, há dois meses, inúmeros foram os alertas da coalizão liderada pelos EUA que luta contra o Estado Islâmico (ISIS): os ataques russos poderiam gerar este tipo de incidente. O mesmo alerta foi feito pelo presidente turco, Recep Tayyip Erdogan. Além da defesa de seu território, Ancara tem outras razões para retaliar, uma vez que boa parte dos insurgentes sírios sob bombardeio possui laços étnicos com os turcos.

Apesar da retórica contra o terror, a Rússia vem priorizando alvos rebeldes sírios em vez dos extremistas do ISIS, mesmo após o grupo assumir a derrubada de um Airbus da companhia russa Metrojet no Sinai, no fim de outubro, e os atentados de Paris, no último dia 13. Isso se explica não só pela aliança estratégica entre Vladimir Putin e o ditador sírio, Bashar al-Assad, mas também pelos vínculos que Moscou mantém com Teerã. Assad, alauita, um sub-ramo do xiismo, tem o apoio dos aiatolás xiitas do Irã e do grupo libanês Hezbollah.

Em retaliação à derrubada de seu caça, Moscou adotou sanções contra Damasco. Convênios comerciais, tecnológicos e culturais foram suspensos. Além disso, 39 executivos turcos, em viagem de negócios, foram detidos em Moscou na quarta-feira por terem entrado no país com vistos de turismo. O primeiro-ministro russo, Dmitri Medvedev, vai anunciar hoje um pacote de sanções econômicas.

Por trás dessas escaramuças, escondem-se estratégias que tornam a guerra civil síria ainda mais um inferno sem fim, tendo como consequência a crise humanitária dos refugiados em êxodo para a Europa. Tanto Rússia como Turquia têm ambições de se tornarem atores regionais influentes, qualquer que seja o desfecho dos conflitos na região, e a sorte de Assad. É bom que comecem por demonstrar que estão à altura da tarefa, buscando uma solução diplomática, que permita a todos se concentrar na luta contra o inimigo comum: o Estado Islâmico.


Fonte: O Globo

sábado, 28 de novembro de 2015

OS POLÍTICOS E AS MANCHETES


Por  Geovani Figueiredo Santos​


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"Os políticos estão sempre dando manchetes ao jornais neste país onde a corrupção tornou-se epidêmica. Brasília transformou-se na capital do ilícito e as prefeituras em sucursais da roubalheira. O brasileiro deveria pensar duas ou três vezes antes de votar e não se deixar iludir por promessas em período de campanha que nunca serão cumpridas por esses falastrões demagogos.

É preciso que o povo amadureça, mostrando a estes mequetrefes que não é moeda de troca em suas negociatas eleitorais. É necessário que haja uma despertamento neste sentido, um vez que todos os anos de pleito eleitoral se  repetem as mesmas cenas corriqueiras de candidatos batendo à porta das pessoas em busca de votos com o maior descaramento e cinismo possível.

Depois de eleitos e acomodados em suas cadeiras, dão as costas aqueles que os elegeram e de forma venal usam o seu cargo para a locupletação. Isso é aviltante, imoral e asqueroso. No entanto, temos a nossa parcela de culpa, porque se eles estão lá curtindo com o dinheiro público e com as nossas caras, a culpa é nossa. Nós apertamos o botão da urna eletrônica e votamos neles. Por esta razão, o exercício do voto de ser realizado de forma consciente, nunca alienado ou preso a interesses de retorno financeiro ou a oportunidades seja do que for. 

Como já disse, o voto não pode ser moeda de troca. Se alguém assim o faz está sendo contrário aos princípios democráticos e tornando-se cúmplice de toda sorte de desmandos que como uma carcinoma mortal tem lançado suas metástases sobre todo o tecido da nação."